terça-feira, 24 de janeiro de 2012

MANUEL BANDEIRA

POÉTICA (Manuel Bandeira 1886-1968)




Estou farto do lirismo comedido

Do lirismo bem comportado

Do lirismo funcionário público com livro de ponto espediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. [diretor.



Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.



Abaixo os puristas.

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais

Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção

Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis



Estou farto do lirismo namorador

Político

Raquítico

Sifilítico

De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo.



De resto não é lirismo

Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as [diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.



Quero antes o lirismo dos loucos

O lirismo dos bêbados

O lirismo difícil e pungente dos bêbados

O lirismo dos clowns de Shakespeare.



- Não quero saber do lirismo que não é libertação.